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Aqui, fala-se de filhos e de tudo o resto...
Sessenta anos. Fazes hoje sessenta anos e eu lembro-me bem de ti com menos de trinta. Mais novo do que eu agora. Quase dez anos mais novo do que eu agora.
Olho para trás e vejo que o tempo passou sem que nos tivéssemos dado conta. Houve várias vidas que deixámos lá longe, à distância de muitos dias, e de ausências, e de vozes perdidas. Deixámos lá atrás o som da música que ouvíamos, a beleza das paisagens, as conversas, o mar... Deixámos lá e não podemos voltar para ir buscar esses momentos.
Apenas a memória nos devolverá a sensação que eu criança e tu jovem trintão. A memória e o aperto no peito... Lembro a espera. Lembro tão bem a espera. Sabes, pai, se há coisa de que me lembro em criança é da espera? De te esperar sem que viesses. E, quando vinhas, da cabeça fora da janela do carro e do vento que me embaraçava os cabelos e me secava a boca. E do vento, pai. Lembro-me bem do vento. E da tua voz entre o vento...
Pois é, pai, sessenta anos e eu quase quarenta. E vidas deixadas lá atrás, amarradas a lembranças que esgotámos e fizemos renascer quase puras. Porque o que deixámos antes, ficará para sempre guardado nas nossas memórias e ressuscitará em quadradinhos de afecto embrulhados em papel celofane que ofertaremos um ao outro em dias de anos. Como este.